Aparentemente, a única utilidade de um banheiro público seria a de resolver as necessidades fisiológicas mais urgentes dos cidadãos. É claro que resolver este problema em casa seria melhor, mas nem sempre dá. O jeito é recorrer ao clássico banheiro de rodoviária, da empresa ou qualquer outro desses que estão à disposição da galera. Trançando as pernas e tentando andar o mais rápido possível disfarçando a cara de angústia, os indivíduos mais apressados conseguem chegar ao recinto para se desfazer daquilo que os aperta tanto.
Em meio ao desconforto provocado pela situação, algumas pessoas se entregam ao desvario e começam um longo processo de reflexão, desenterrando seus traumas infantis, entre eles o de não ter se tornado um bom escritor ou de não ter tido pais e amigos para ouvirem as suas aflições. Como uma espécie de terapia, estes escritores banheirais demonstram toda a sua arte e filosofia de vida nas portas dos banheiros. Vejamos os tipos de escritores banheirais de sucesso:
Banheiral liga para mim: este é um dos escritores banheirais mais infelizes e carentes que podem existir. Não satisfeito em estar só naquele momento de “aperto” e puro desconforto, ele começa a se lembrar da solidão da vida diária. Desesperado, anota o seu número de telefone em todos os cantinhos da porta do banheiro, esperançoso que alguém ligue interessado por uma amizade ou até uma paquera, quem sabe? É normalmente tímido, por isso só se revela no banheiro.
Banheirais Lispector: são aquelas que acreditam que banheiro também é filosofia e introspecção. Dedicam-se em escrever versinhos, letras de música e frases de autores desconhecidos. No geral, são também desenhistas, pois decoram os poemas com bordas floridas ou notas musicais. São pessoas sensíveis e que possivelmente já tiveram muitas desilusões amorosas na vida. Por esta razão, transformam o banheiro em um lugar próprio para o início do seu tratamento.
Covarde banheiral: este é o sujeito que tem sérios problemas em assumir o que pensa do outro e vê na porta do banheiro a forma de se expressar. Pessoa fácil de arrumar confusão, mas medroso para encarar a briga e acabar apanhando muito, o covarde banheiral escreve deliberamente insultos, dos mais variados, para todos os parentes do indivíduo que ele quer agredir, sem se identificar.
Banheiral partidário: em época de campanha, não existe banheiral melhor. Ele se empenha em mostrar a sua posição política e de forma não-consciente, risca a porta com o número do seu candidato predileto ou então com o símbolo do partido que defende. Costuma dizer que está ajudando o país a tomar decisões e que é responsável em tudo o que faz.
Turista banheiral: é o cidadão que ama um intercâmbio. É simples: ele escreve alguma coisa, qualquer coisa mesmo e dias depois outros participantes surgem adicionando comentários acerca do que foi escrito inicialmente. É uma
espécie de troca de mensagens. O turista banheiral se preocupa em deixar vestígios do tipo: “Passei por aqui” com o famoso desenho de pegadas para ilustração. Não é uma pessoa que acessa muito a Internet ou manda mensagens pelo celular, afinal de contas para que tudo isto se as portas de banheiro existem?
Banheiral publicitário: é aquele “cara” empreendedor e que gosta de economia. Propaganda sem custo é com ele mesmo! Defende o seu comércio até no banheiro com pequenos anúncios e telefones para contato. O banheiral publicitário vende carro, aluga fantasia e até divulga vaga em seu apartamento para quem quiser morar com ele. Solidário ou interesseiro? Difícil responder, mas a conclusão que se pode ter é que este tipo de banheiral gosta de tirar proveito da situação.
Religioso banheiral: este é o banheiral apaziguador. É o cidadão que até nas horas difíceis da vida e de puro contorcionismo está pensando no bem da humanidade. Ele é concentrado, calmo e capricha na letra. Vê na porta do banheiro a chance de escrever algo para acalmar todos os indivíduos angustiados que entrarem ali em busca de paz e de uma mensagem consoladora.
Banheiral vândalo: este banheiral não gosta de banheiros públicos. Para ele, as coisas só prestam enquanto servem para o seu uso, mas depois de usado não interessam mais. Suas mensagens nas portas são rabiscos que ninguém entende ou então as lascas de madeira retiradas somente para estragar. É o “bobalhão” que gosta de chamar a atenção e não sabe como, por isso afoga as suas mágoas nos banheiros da vida.
São muitos os tipos de escritores banheirais espalhados pelo mundo. Verdadeiros artistas que precisam ser revelados. Cada um conserva em si características próprias, mas todos se unem no propósito de encontrar soluções para os seus problemas através da reflexão e da escrita. A terapia acontece todos os dias no banheiro mais próximo de você. Talvez, neste momento de sofrimento em busca de um banheiro, você pode se descobrir um banheiral. Não se desespere! As portas dos banheiros estarão livres para serem preenchidas por seus escritos.
Texto produzido em: Língua Portuguesa III. Objetivo: Descrição de tipo
4 comentários:
Maristela
Sou amiga de George ele me indicou teu blog.
Parabéns, sempre dizia que alguem tinha que fazer uma análise sobre essas frases dos banheiros. Adorei.
Abraços,
Nathalie Fontes
Nada como uma análise sobre a filosofia de banheiro.Tanto se fala na filosofia de boteco, na filosofia de caminhão...mas a filosofia de banheiro andava esquecida pelos comunicólogos.
Parabens Maristela!
brilhante! perfeito! espetacular!
AAAAAleluiiiiaa, aaaaaaalllleluiaa, aleluia, aleluia aleeluiáááááááá!!!!!!!! Até que em fim!!! Demorou, mas quando veio detonou kkk barbaro o texto, já o conhecia, mas não me lembrava o quanto ele era bom!!!
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